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- Árido: um caminho
Relato por Tiago Delácio. Vários pavios culturais explodiram na década de 90 em Pernambuco, mas o big bang foi o movimento mangue beat. Nessa época, a minha passagem do ensino médio para o curso de Jornalismo da UFPE seria também o sentimento de fazer parte do cinema que estava novamente brotando das ruas do Recife. E, da poltrona do Teatro do Parque, como espectador, me senti dirigindo junto com Paulo e Lírio, o Baile Perfumado para então reafirmar minha opção por viver ao lado do nosso cinema. O Baile foi tão impactante sobre as rochas dos cânions do São Francisco, ao som do Nação Zumbi, Fred Zero4 e Mestre Ambrósio que semeou a retomada da produção do cinema em Pernambuco. Esse experimentalismo foi responsável pelo impulso criativo e a percepção ampliada até de um jeito local de fazer filmes, a brodagem do cinema pernambucano. Meus dias eram de cinema e movimento estudantil. Comprei minha primeira filmadora parcelada no cartão de Chico de Assis, tocava com uma galera o Cineclube Barravento, batia ponto na Classic Vídeo e percorria os bairros de Olinda com o projeto Cinema na Praça. Até que parti para um sonho da época, cursar um taller na EICTV, em Havana. De lá, comecei a acompanhar a movimentação de duas equipes de produção. Estavam contratando para o novo filme de Lírio, Árido Movie, e outra equipe, montando para rodar o Cinema, aspirina e urubus de Marcelo Gomes. Ainda em Cuba mandei uns e-mails para as produções com o currículo e vontade, enquanto lia “Cine Imperfecto” de García Espinosa ficava mais longe minhas chances de fazer parte de uma delas. Tiago Delácio nas filmagens do filme Árido Movie - Fotos: acervo pessoal. Dias se passaram, contatos foram feitos, mas a equipe estava formada quando cheguei em Recife. De um lado as vans subiam para Arcoverde para preparar a filmagem do Árido, um pouco mais ao norte, a equipe do Cinema, Aspirina e Urubus, na Paraíba, entre Pocinhos e Cabaceira. Mesmo com os primeiros dias de set filmados, Júlia Moraes, assistente de direção do Árido, me convida para fazer a segunda assistência. No outro dia, estava eu lá em Arcoverde virado no mói de coentro. Dois dias depois, uma rearrumação na equipe e me transformei no continuísta do filme, nessa hora só tentava lembrar o que Adelina Pontual tinha falando em alguma aula. Lá fui eu com a prancheta, caneta e cronômetro vivendo aquele dias de sonho e trabalho. Os moradores de Arcoverde paravam para acompanhar as filmagens e ver rostos conhecidos de Giulia Gam, José do Monte, Matheus Nachtergaele, Paulo César Pereio, Mariana Lima, Selton Mello e José Celso Martinez. O calor massacrante da estrada, as locações sinistras, a arte oposta de Renata Pinheiro dava o ambiente subjetivo que o filme precisava. O cenário do "O POSTO" onde o protagonista Lázaro sai com Wedja ao som de Renato e seus Blue Caps destranca um roteiro aberto, cheio de fragmentos e histórias não encerradas, como é a nossa própria existência, sem fim até depois da morte. Enquanto Lírio tinha o filme na cabeça, os demais quebravam a cabeça para encaixar no plano de filmagem, o filme em si estava bem longe do próprio roteiro e essa era a ideia. Nunca li tanto um roteiro como o Árido, era imprevisível entregar a minutagem, a descrição da cena, as tomadas, o tipo de filtro e o número do negativo para a montagem fazer os encaixes. Lírio confiava nos atores e na capacidade de improvisar o texto, mandava a fotografia rodar mesmo que a película de 35mm quantas vezes precisasse, a produção ali só não fez chover e, no final, astralizava e, pronto, dava tudo certo. Não foi fácil, mais do que ter uma memória visual e um acompanhamento cirúrgico das falas, ações, gestos, figurinos, para garantir o plano de filmagem, cabia também ao continuísta lembrar do enquadramento da câmera, a lente, o filtro daquela cena, a minutagem e em qual rolo está cada cena. Entre tantos desencontros, um copião extraviado no laboratório do Rio exigiu que fosse refilmado algumas cenas meses depois de desprodução. Foi uma loucura que valeu mais que qualquer curso de cinema. Embora para quem assiste ao filme, a narrativa não se encerra, quem é o doido de fazer o segundo filme? Em 2020, fui ao Festival de Cinema do Rio de Janeiro exibir o curta-metragem Enraizada e assisti ao lançamento do Aqua Movie com Lírio e parte da equipe. O Aqua é mais que uma continuação, é uma espécie de reencarnação e que compõe mais um pouco desses fragmentos tortuosos entre mar e seca, litoral e sertão, raízes e asas. Claro, são filhos do mesmo pai, voaram pelos mesmos caminhos e também ficaram presos nas mesmas agruras e limites de seus voos. Muito distante dos sonhos da década de 2000, uma grande tormenta social descambou no Golpe de 2016 e a eleição de um presidente cuja marca é a destruição das políticas de fomento ao audiovisual e a caçada ideológica contra os artistas. Um país com mais de meio milhão de mortes pela pandemia, quase todos os cinemas fechados e um governo com viés facista, nos leva a acreditar - apenas - que a Montanha do Cachorro que está na cidade ficcional de Rocha antes dos homens existirem, vai continuar existindo. Sobre o autor: Realizador audiovisual, com especialização na Escuela Internacional de Cine y TV (Havana) e mestrado em Desenvolvimento Urbano (UFPE), Tiago Delácio é coordenador do Museu de Animação Lula Gonzaga (MUCA) e da Mostra de Cinema Ambiental do Recife (MARÉ). Dirigiu os curtas: La espera (8’, 2003), Velocidade Máxima (7’, 2013), Enraizada (8’, 2018), Eu o declaro meu inimigo (2’, 2018) e Martelo (6’, 2021).
- 'Chão de Estrelas', série inspirada no filme 'Tatuagem', estreia sexta-feira no Canal Brasil
A produção é uma releitura da trupe de teatro Chão de Estrelas, que conta com narrativa contemporânea. Estreia na próxima sexta-feira (10), a série "Chão de Estrelas" de Hilton Lacerda. Criada a partir do filme "Tatuagem", primeiro longa de Hilton, a série gira em torno de um grupo teatral anárquico formado por integrantes com origens e histórias diversas, que ocupa um casarão no Centro Histórico do Recife. Serão sete episódios, que irão ao ar às sextas, às 22h30 no Canal Brasil. De acordo com Hilton Lacerda, a série é um aprofundamento do grupo de teatro criado no filme Tatuagem, mas com uma narrativa contemporânea voltada para os problemas atuais da sociedade. A 'nova' trupe agora ocupa o casarão de Dionísio, interpretado por Paulo André, famoso e recluso artista plástico. Quando o casarão corre o risco de ser tomado por uma poderosa construtora, os integrantes do Chão de Estrelas iniciam um movimento pela manutenção do espaço. "Chão de Estrelas é puro conflito, em todos os níveis, e mergulha num universo onde várias artes comungam do mesmo fim: promover uma incômoda festa que nos sirva de barricada no presente para nos escudar lá no futuro. E com arte. Muita arte”, descreve o diretor Hilton Lacerda. Leia também: Hilton Lacerda: cinema, liberdade e a pluralidade do Cinema Pernambucano Tatuagem: de dentro para fora, um estudo do processo de criação a partir do roteiro do filme A narrativa é construída em torno de conflitos externos e internos da trupe, abordando temas como o desprezo à cultura por parte da sociedade conservadora e especulação imobiliária. A produção constrói a mistura perfeita para a batalha criativa, onde arte e resistência lutam para falar a mesma linguagem, e a memória é o combustível para enfrentar o presente e modificar o amanhã. No final de cada episódio, há depoimentos dos personagens sobre conflitos próprios e coletivos que ajudam a costurar a trama. Os episódios estarão disponíveis nos serviços de streaming Canais Globo e Globoplay +Canais ao Vivo. Informações técnicas Chão de Estrelas (2021) (7x50’) Direção: Hilton Lacerda e Milena Times Elenco: Giordano Castro, Nash Laila, Uiliana Lima, Gustavo Patriota, Dante Olivier, Mário Sérgio Castro, Matheus Tchoka, Ana Paula Gaspar, Paulo André, Ana Marinho, Sílvio Restiffe, Lívia Falcão, Titina Medeiros e Sandro Guerra. Classificação etária: 16 anos Estreia: sexta, dia 10/09, às 22h30 Horário: sexta, às 22h30 Alternativos: madrugada de domingo/segunda, às 2h; madrugada de quarta/quinta, às 4h; e segunda, às 0h30.
- Jomard Muniz de Britto: corpo-poesia, nudez e subversão
As relações corporais como narrativas em filmes de Jomard Muniz de Britto. (+18) Conhecido também pela sua ousadia e subversão como artista poeta, Jomard Muniz de Britto contribui para construção de um importante movimento cineasta em Pernambuco. Seus filmes fizeram importantes construções do movimento e marcaram o Ciclo Super-8 trazendo performances que se destacavam pela irreverência e subversão, seja com a exibição de corpos nus ou até mesmo na crítica ao contexto cultural do estado. Não somente marcou o ciclo como também se destacou construindo poesias visuais nos filmes. Em alguns deles, Jomard constrói narrativas performáticas que transcendem a imagem e demonstram a poesia dos corpos, da nudez, da transgressão e subversão. Em “Vivencial I”, vemos um grupo de teatro em apresentações pelas ruas do Recife. Jomard registra o espetáculo e os corpos que dançam, performam e trazem essa narrativa corporal, vista em outros curtas do cineasta. Em “Aquarelas do Brasil”, um dançarino se expressa num dos pontos turísticos da cidade, mais uma vez o corpo em evidência. No filme “Uma Experiência Didática”, o corpo em nudez transforma a narrativa em poesia, onde os gestos e movimentos são super expressivos. Já no filme “Toque”, os artistas dançam e performam a nudez e a subversão do corpo nu. Todos esses filmes citados e outros, demonstram a relação entre os trabalhos de JMB e o culto ao corpo, a poesia, a subversão e a transgressão. O cineasta, por meio de relações corporais em seus filmes, faz do corpo uma poesia. Diria um “Corpo-Poesia”, construindo narrativas corporais e poéticas onde a nudez é naturalizada pelo diretor, embora seja vista como transgressora pela sociedade, e as relações entre os atores dão origem a poesias visuais, narradas através das lentes da câmera de cinema. Sendo o cinema uma das formas de exercer poder sobre o público por meio das narrativas cinematográficas, a problematização do corpo nu, em evidência como referência, toma maior tempo de tela em muitos filmes de Jomard. Há a necessidade de evidenciar a experiência, o corpo, a nudez e a sexualidade, não como plano de fundo, mas com protagonismo, em narrativas fílmicas. Nos filmes de Jomard Muniz de Britto, temos a naturalização do corpo, da nudez e da sexualidade impulsionada pelas constantes narrativas corporais e poéticas do diretor. Pensando assim, apresentar e evidenciar o corpo que foge dos tabus, subvertendo as narrativas, não é só necessário, mas parte da identidade do poeta, cineasta e escritor. Argumento e Vídeo Ensaio por Cladisson.
- O Voo do Viajante Alado
Em “O Voo do Viajante Alado”, a Spia resgata o relato de Paulo Rafael para o livro "As Aventuras do Baile Perfumado: 20 anos depois". "Eu tinha feito apenas coisas bem esporádicas para cinema. Eu tinha feito a trilha de um curta para Lírio Ferreira, um curta bem experimental, que até ganhou um prêmio de melhor música num festival da Bahia. Também tinha feito a música e a trilha incidental de Pátria Amada, de Tizuka Yamazaki. Como na trilha estavam Alceu Valença e Carlos Fernando, com quem eu tinha muita intimidade, acabei assumindo. Cerca de um ano antes das filmagens do Baile Perfumado, eu estava me mudando de Olinda, voltando para o Rio. Foi quando Geraldinho Magalhães, que estava cuidando da produção musical do filme, me convidou para assumir a direção musical. Na verdade, foi nesse momento que eu fui tomando pé da situação. Havia muitos comentários, todos os meus conhecidos do Recife já estavam curtindo a informação de que havia um longa sendo rodado. Já existiam muitas lendas e histórias: “Olha, eles estão filmando, Lírio e Paulo Caldas…”. De vez em quando, chegava alguém vindo das filmagens e começava a comentar que estava rolando isso ou aquilo. E ficava todo mundo querendo participar de alguma forma daquele projeto. Mas, no meu caso, foi muito por insistência de Geraldinho. Quando Geraldinho me convidou é que comecei a me informar melhor. Fiquei mais perto. Um dia, me passaram uma versão do roteiro, mas chegava alguém para me alertar: “Olha, nem leia isso que mudou tudo…” De todo modo, li uma parte do roteiro para entender como era a história. Posteriormente, Marcelo Pinheiro me ajudou muito a entender o que estava por trás daquela história. A bem da verdade, eu diria que quando eu entrei no processo foi na função de um motorista que dá uma freada para arrumar o caminhão. Porque todo mundo estava ou tinha passado pelo estúdio do Conservatório Pernambucano de Música para gravar. Já tinha material gravado de Chico Science, Lúcio Maia, Siba (que era o Mestre Ambrósio), Fred Zero Quatro, Stela Campos… ou seja: todo mundo que estava envolvido com o que se fazia naquele momento no Recife em termos musicais. Eu sabia do trabalho de todos eles, mas na verdade não conhecia todos em profundidade, a não ser a Nação Zumbi e Siba. E a primeira impressão que eu tive quando me entregaram os rolos - porque foi tudo gravado em fita de rolo, ainda em 16 canais -, chamei um técnico de som que eu conhecia para vir ao estúdio do Conservatório. E o cara me alertou: “Olha, se prepare porque é um quebra-cabeça, Você vai ter que montar um quebra-cabeça gigante”. Comecei a ouvir as gravações, tinha muita coisa. Porque no início, antes de me chamarem, as coisas funcionaram assim: alguém convidava os músicos, passava um briefing, e eles entravam no estúdio e passavam o dia tocando, fazendo música. Disso resultaram horas e horas de gravação. Todo o material tinha uma certa orientação de Lírio Ferreira e Paulo Caldas, e cerca de 90% das músicas já estavam gravadas. Embora quase tudo estivesse feito, sempre faltava um pedaço. Era tudo esboço. Um esboço que exigia que a gente voltasse para eles. Eram milhões de esboços, e comecei a filtrar, a filtrar. A partir desse momento, defini um pouco sobre o que iria ou não entrar. Fazia uma seleção e levava para os diretores, mostrava, conversava. E eles já achavam que estava resolvido: “Está tudo pronto?”. E eu dizia: “Não, não está pronto!”. Seria preciso regravar para tudo ficar realmente pronto, bem acabado. E a produção enlouquecia: “Ai, meu Deus do céu, tem mesmo que refazer?” Algumas coisas, portanto, estavam para terminar, concluir, resolver, editar no estúdio… Um bocado de coisa que precisava regravar. Nesse momento eu já estava morando no Rio. Então eu comecei a perceber que havia nessa etapa uma resistência incrível, porque todo mundo já achava que aquilo que tinha gravado estava bom, concluído. O próprio Siba, que tinha acabado de gravar o disco do Mestre Ambrósio, dizia que não estava mais com cabeça: “Porra, eu vou ter que gravar aquilo tudinho de novo?” Eu insistia: “E você vai deixar desse jeito, cara? A ideia está fantástica, mas tem que dar um acabamento”. Aos pouquinhos, comecei a convencer Siba. Depois dele foi mais fácil convencer Lúcio Maia, depois convencer Chico Science, Fred Zero Quatro, todos os outros. Todo mundo ajeitando as gravações. Eu pegava aqueles borrões, aqueles esboços e saia gravando por cima. Então essa foi a primeira etapa. A segunda etapa eu já trouxe para o Rio. Havia boas ideias porque como o projeto era fazer um disco - nem era DVD ainda - como o material era pra fazer parte de um disco uniforme, chamei o Dj Suba, que tinha uma pegada mais forte de música eletrônica. E decidi que ele também iria entrar na trilha do filme. Porque eu comecei a observar que tinha muita coisa que precisaria recombinar. Eu tinha uma banda chamada Eletro Fluminas, com o tecladista Márcio Lomiranda. Eu me propus, então, participar da trilha não apenas na direção musical. Pedi mesmo: “Deixa eu colocar umas músicas minhas aqui também”. Eram mais músicas que poderíamos chamar de músicas de fundo. Não eram os temas principais, que eram sempre cantados. As minhas músicas eram de apoio, que fomos fazendo puxando para um lado mais eletrônico, que serviria para complementar todo o resto. Por fim, eu mixei. Lírio e Paulo estavam editando em Botafogo, bem perto de onde ficava a minha casa. E comecei a frequentar. Era uma energia fantástica, os caras estavam curtindo pra caramba. Foi a primeira vez que eu vi as imagens e o som que vinha do set. Porque até então era tudo na imaginação. Nesse momento, Lírio e Paulo já sabiam exatamente onde colocar as músicas. Eles sabiam da importância que teria a trilha para conduzir a narrativa. Quando eu vi o filme pronto foi ainda surpreendente. Eu pensava: “Olha, aquela música entrou nessa sequência”. Mas quando eu vi a cena de Lampião naquela pedra, fiquei arrepiado. Aliás, eu fico arrepiado até hoje. Eu senti um impacto enorme. Tanto que pensei na hora: “Puta que pariu, isso aí vai mudar um monte de coisas” Eu senti na hora que já era uma linguagem nova do cinema. E eu digo: “Negão deu um passo”. Sangue de Bairro (Chico Science e Ortinho) Besouro/ Moderno/ Ezequiel/ Candeeiro/ Serra Preta/ Labareda/ Azulão/ Mamoeiro/ Quinaquina/ Bananeira/ Sabonete/ Catingueira/ Limoeiro/ Lamparina/ Mergulhão/ Corisco/ Voltaseca/ Jararaca/ Cajarana/ Viriato Gitirana/ Voltabrava/ Meia Noite/ Zabelê Quando degolaram minha cabeça, passei mais de dois minutos vendo meu corpo tremer E não sabia o que fazer, morrer, viver, morrer, viver Nesse universo que é o filme, eu me considero uma particulazinha. Mas os diretores não: eles deram um tiro lá na frente. Fiquei muito emocionado. Aquelas imagens ficaram perpetuadas, porque não eram imagens antigas ou novas. Ficou uma coisa atemporal. Fiquei muito feliz por ter participado do Baile Perfumado. Eu acho que o filme foi um trabalho fundamental para o cinema, para a música pernambucana, para que todo mundo pudesse se sentir valorizado. Eu acho que o Baile foi o que deu a alavancada para toda essa coisa que veio depois no cinema em Pernambuco. Eu fiquei só felicidade." Gravação da trilha sonora do filme Baile Perfumado no Conservatório Pernambucano de Música. 1- Chico Science - Foto: Fred Jordão; 2- Fred 04 - Foto: Fred Jordão. Relato extraído do livro "A Aventura do Baile Perfumado: 20 anos depois".
- O afeto das memórias pelas lentes de Géssica Amorim
A partir das fotografias de Géssica Amorim, refletimos a importância do fazer fotográfico na construção da identidade e a permanência dos afetos. Embora pensados em muitos casos de formas apartadas, a fotografia e o tempo se entrelaçam na construção da identidade e partilham um sentimento único: o afeto das memórias. Stuart Hall (1932-2014) foi um teórico cultural e sociólogo, que dedicou-se a compreender e valorizar o estudo da cultura. Em seu livro “A identidade cultural na pós-modernidade” (1992), Hall traça uma narrativa acerca da relação entre o homem e a identidade moderna, o mesmo afirma que por muito tempo as identidades eram sólidas e os indivíduos se encaixavam nas ideias já estabelecidas, com o passar do tempo as identidades se encontram menos definidas e atravessam novas significações para o espaço social e cultural. Géssica Amorim, 27, traça uma narrativa identitária a partir do seu olhar sincero, político e afetuoso acerca daquilo que conhece e perpassa seu cotidiano. A artista está cursando a segunda graduação, sendo essa, em Comunicação Social pela Universidade Federal de Pernambuco no Campus Acadêmico do Agreste (CAA) e trabalha como estagiária na Marco Zero Conteúdo. A narrativa fotográfica traçada em seu perfil no instagram (@gessicamorim) desvendava uma voz sincera, que sempre me acalentou o peito e me reafirma a importância das narrativas múltiplas acerca daquilo que conhecemos e identificamos como história. “O lugar onde vivo e que costumo registrar com mais frequência é estereotipado desde sempre. Os assuntos, o que varia, o que é singular no espaço e nas pessoas são diluídos e impressos numa mensagem só. Talvez isso confuda quem vê de longe. O meu tema é o que está ao meu redor, o que faz parte da minha existência, do que eu vivo no mundo. É mais íntimo do que parece.” Reflete a artista nascida no sertão do Pajeú, no sítio dos Nunes. O município é conhecido como uma terra cheia de poesia e retratado de maneira singular pelo olhar de Géssica, que afirma que sua fotografia “É sobre o que vejo no meu pedaço. O que cresci vendo e vivendo. Me apego ao que me é familiar. Fico andando atrás de mim, registrando o que e onde me reconheço.” Esses são os registros de Géssica Amorim: uma busca aos afetos. Quando você se descobriu fotógrafa? Qual papel a fotografia tem para você? Géssica Amorim: Na verdade, eu não me considero fotógrafa. Acho que, pra isso, eu teria de atender a uma série de critérios que envolvem técnicas e estilos que, por vezes, não domino ou não me interessam. Eu sou amadora. Pra conseguir a carteirinha de fotógrafa, é muita exigência, muita obediência (risos). Clarice Lispector dizia que não queria ser reconhecida como escritora pra manter a sua liberdade enquanto escrevia. Ela sempre se considerou amadora. E eu acho isso honesto e fantástico. Penso igual. Me agarrando a isso honestamente, eu me mantenho livre para aprender, experimentar e produzir o que eu quiser. Sem obrigação de entregar um produto "profissional", de “alto nível". Pra mim, isso é só engraçado, não um objetivo. A fotografia me ajuda a suportar. O papel dela na minha vida é esse. Esqueço de tudo quando estou fotografando. Me concentro no que vejo e quero registrar. Não existe mais nada além do que enxergo por trás da câmera. Cada fotógrafo tem um objeto de estudo, um campo particular que o encanta. Você acredita que há um objeto/campo que te encante mais na fotografia? Se sim, qual/quais? GA: Eu não sou apegada a um tema específico, nesse sentido. Olhando o que eu publico, pode ser que pareça que eu corro atrás de um tema só, mas não é isso. O lugar onde vivo e que costumo registrar com mais frequência é estereotipado desde sempre. Os assuntos, o que varia, o que é singular no espaço e nas pessoas são diluídos e impressos numa mensagem só. Talvez isso confunda quem vê de longe. O meu tema é o que está ao meu redor, o que faz parte da minha existência, do que eu vivo no mundo. É mais íntimo do que parece. Sua produção artística é um embarque ao passado-presente, há sensíveis textos que acompanham as tuas fotografias em seu perfil do Instagram. Qual o valor da escrita na tua arte? GA: Olha, eu acho que a escrita vem quando as imagens não bastam em alguns casos. Tenho escrito com menos frequência a respeito de algumas imagens e dos significados delas. E eu escrevo quando acho realmente necessário, quando o sentimento me pede. Talvez seja o que chamam de inspiração, não sei. Eu sei que não forço a barra. Não aqui, no que é meu e onde posso ser livre. Quando vem, eu deixo aparecer. É só isso mesmo. Tem uma série fotográfica em seu instagram que relata os recados deixados no verso de algumas fotografias. Como você enxerga a fotografia impressa e qual peso ela consegue verter na sua concepção? GA: Eu sempre achei e acho muito interessante essas mensagens, recados e dedicatórias que a gente escrevia nos versos das fotografias. Eu consigo imaginar o que foi revelado sem olhar a imagem - sem falar na coisa de usar essa imagem como presente, lembrança. Eu acho muito bonito. Queria entregar e receber imagens assim também. Imagem-presente-recado por Géssica Amorim Tem algum registro que você fez que pode ser considerado como seu preferido? Se sim, qual e porquê? GA: Eu ia dizer que não, pra evitar pensar e avaliar demais (risos). Mas, há pouco tempo, levei uma cama para o terreiro e fotografei o conforto que enxergo nela, ali, no meio do mundo. Tentando dizer, mesmo, que qualquer lugar do mundo é casa. Gosto muito dela. Cama no terreiro por Géssica Amorim. Entrevista pro Cecília Tavora.
- Destaque: Uma viagem ao passado sem tirar os pés do presente
Por Maria Clara Mendes. A grandeza de um disco pode ser observada de inúmeras formas. Gosto de pensar que a obra de Alceu tem a autonomia para falar por si mesma, basta colocar o disco para tocar e pronto, está dito. O Cinco Sentidos, lançado em 1981, tem a força, a sensibilidade e o atrevimento que só poderia surgir da mente de um artista como Alceu Valença. O álbum traz algumas memórias da infância do músico pernambucano, é uma viagem ao passado sem tirar os pés do presente. Com uma intensa dose de intimidade e desejo, ao longo das nove faixas, somos levados a experiências que jamais serão esquecidas. São as nossas emoções se misturando com as emoções do autor. Parece um filme cujo diretor é um cabeludo, sensível e teimoso que tem apenas trinta e dois minutos para dizer tudo e mais um pouco. E ele manifesta, de forma poética e arrebatadora, a sua mensagem e a sua essência enquanto homem, menino, artista e pernambucano. A última faixa do disco sintetiza bem. Seixo Miúdo. O Cinco Sentidos vendeu 150 mil cópias e colocou Alceu no ápice dos grandes shows, seu lugar por merecimento. É um álbum que aponta o rumo que a carreira do artista iria seguir na década de 1980, mas que ainda traz o resquício da ternura presente em sua poderosa obra setentista. Em tempos estranhos de pandemia e de tantos conflitos políticos, ouvir o Cinco Sentidos é uma boa pedida para sempre nos lembrarmos quem somos e o que nunca deixaremos de ser. “Minha língua ferina só cala no fim do espetáculo…” Link do álbum no Spotify Link do álbum no YouTube
- Revista Spia é vencedora do Expocom Nordeste na categoria Produção Multimídia
Estamos muito felizes em compartilhar esse resultado com vocês, que é reflexo do esforço e dedicação da nossa equipe e de vários colaboradores pela arte e cinema pernambucano. O Expocom é uma exposição de pesquisas experimentais em comunicação destinada aos melhores trabalhos produzidos por estudantes no campo da Comunicação. A Revista Spia era finalista na categoria Produção Multimídia, uma modalidade de Produção Transdisciplinar e conseguiu o prêmio da etapa Regional, o Expocom Nordeste. Agradecemos a todo mundo que acredita, compartilha e faz parte desse projeto. Um obrigado especial a Amanda Mansur, nossa orientadora, Márcio Correia, Hanna Aragão, Maria Clara Mendes, Ade Queiroz, Samara Torres e Cecília Távora. Viva o curso de Comunicação Social da UFPE- Caruaru! Viva a Universidade Pública!
- Artistas de Caruaru realizam a 4ª Feira Vital no Alto do Moura
Artistas caruaruenses estão realizando um movimento semanal no bairro Alto do Moura. Neste sábado, 24 de julho, das 10 às 19h, em frente ao Centro de Atendimento ao Turista - CAT, localizado na praça ao lado do letreiro Alto do Moura, realizarão a quarta edição da Feira Vital. Os envolvides no movimento estão comprometidos com as orientações de distanciamento social e utilização de máscaras e álcool em gel por conta da pandemia de Covid-19. Serão comercializados no espaço obras de arte, livros, comidas, etc. Também ocorrerá a exibição do filme "A Peleja do Bumba-Meu-Boi Contra o Vampiro do meio-dia", uma ação do movimento Barro e Poesia. O que é a Feira Vital? É um movimento dos artistas das diversas categorias que começou em julho de 2021 no Alto do Moura para comercialização dos trabalhos artísticos em praça pública. E como funciona? São artistas INDEPENDENTES e organizados com objetivo de fortalecer a pluralidade artística e quebrar os tabus. Para liberdade artística dos envolvides, funcionam com o apoio próprio, se organizando dentro dos limites físico, mental e financeiro que possuem, estabelecendo a educação e o respeito pelo próximo, dialogando no sentido de todes serem os zeladores dos espaços culturais, públicos, das culturas locais e da boa vivência. O espaço está aberto a qualquer artista que queira colaborar, desde que se comprometa a cumprir as normas de convivência coletiva estabelecidas. "Nossas vozes e forças só poderão ser fortalecidas se a união dos artistas "não soltar a mão de ninguém" e não deixar cair no controle do domínio público, somos multiplicadores da educação pelos saberes artísticos, culturais, plurais e para conquistarmos uma independência organizada é preciso se libertar das amarras e se organizar coletivamente." - Shivo Araújo, membro organizador do movimento. O movimento cresce com as diversidades artísticas de Caruaru, com objetivo de fortalecer a independência ocupando o espaço que é de todes. SERVIÇO: IV Feira Vital do Alto do Moura Sábado, 24 de julho, das 10 às 19h, em frente ao Centro de Atendimento ao Turista - CAT, localizado na praça ao lado do letreiro Alto do Moura
- A Brodagem no Cinema em Pernambuco
“Quem tem amigos não faz filme ruim.” Kleber Mendonça Filho Por Amanda Mansur. Foi fazendo filmes que tive o primeiro contato com os afetos e com a maneira de os cineastas produzirem filmes, colocando-se em risco e apaixonados pelo cinema, acima de tudo. Minha primeira experiência efetiva com cinema foi no filme Deserto Feliz, como segunda assistente de Direção, de Paulo Caldas. Foi no set do Deserto Feliz que pela primeira vez tive contato com a história do Grupo Vanretrô, da década de 1980. Eu já tinha uma forte admiração pelos filmes Baile Perfumado, Cinema, Aspirinas e Urubus e Árido Movie, que assistira antes. Mas foi somente nos intervalos entre a filmagem de uma cena e outra que descobri que Paulo Caldas, Lírio Ferreira, Adelina Pontual e Valéria Ferro eram da mesma turma da universidade, e que Marcelo Gomes e Cláudio Assis eram seus contemporâneos. Conheci Vânia Debs (a montadora de vários filmes realizados em Pernambuco, incluindo Deserto Feliz) antes mesmo de ser apresentada a ela, de tanto Paulo Jacinto Reis (1963-2011), o diretor de Fotografia, mencioná-la nos planos que ele criava para a personagem do filme, Jéssica. Na produtora de Germano Coelho (1958-2010), a Camará Filmes, conheci mais um monte de gente de cinema, que participava direta ou indiretamente da realização do filme. Em Pernambuco é assim, você acaba conhecendo todo mundo do cinema. A produção de um filme transborda pela cidade, ocupa suas ruas, invade as casas e apartamentos, circula pelos bairros. O cinema vem junto de pessoas que você encontra nos sets, é claro, mas igualmente nas salas de cinema, nos cineclubes, nos cafés e nos bares. A partir de Deserto Feliz, acabei circulando por essa cena audiovisual da cidade. No esquema da brodagem – que nas próximas páginas tentarei circunscrever –, ganhei padrinhos (Germano Coelho, Paulo Caldas e Camilo Cavalcante) e madrinhas (Stella Zimmerman e Adelina Pontual), que me convidaram para participar de outros projetos. Percebi, adotada a esse modelo produtivo, que a mesma coisa ocorrera – e ocorria – com muitos outros profissionais ou aspirantes a profissionais. Na mesma época em que me aproximava desse universo da produção de cinema em Pernambuco, eu cursava Radialismo e TV na Universidade Federal de Pernambuco. Lá no prédio do Centro de Artes e Comunicação, compartilhei de outros afetos cinematográficos. Enquanto frequentava as sessões do Cineclube Barravento, assistia aos vídeos da Símio nos Festivais e acompanhava a criação do coletivo Trincheira Filmes no “corredor de comunicação.” Compartilhávamos dos mesmos lugares, festas e amigos. Assim, fui assistente de Direção de Marcelo Lordello, em seu longa Vigias; organizei a documentação de cadastro de produtor cultural da Símio: Daniel Bandeira, Marcelo Pedroso e Gabriel Mascaro. No esquema de brodagem, o prédio onde moro serviu de locação para três filmes produzidos pela Trincheira: Vigias (2010), Ela Morava na Frente do Cinema (2011) e Eles Voltam (2012). A intensidade do processo produtivo de Pernambuco permitiu que, durante esse período, eu também tivesse a oportunidade de realizar filmes com pessoas de outros lugares e em outros Estados. Nessa experiência “estrangeira”, pude perceber que os filmes dos “outros” se organizaram a partir de uma forte hierarquia e que, na prática, isso gerava tensão e ansiedade. Eu pensava: “Isso aqui é diferente de Pernambuco.” Mas onde situar a diferença? Em que ela consistia efetivamente, para além de um clima mais amistoso e afetuoso nos sets e nos lugares frequentados pelos cineastas? Aprendi com as duas gerações o prazer de fazer cinema com os amigos. Constatei que eles só sabem fazer cinema entre amigos. E que foi o cinema que despertou os sentimentos de união desses grupos. Também aprendi, nos festivais de cinema, que não se faz cinema pernambucano sem festa, porque festejar o cinema faz parte desse processo. Afinal, como fala Lírio Ferreira, cinema pernambucano é um copo na mão e uma ideia na cabeça! E o cinema é o território onde se manifestam afetos. No ano 2012, dois filmes pernambucanos dividiram o prêmio de Melhor Filme no tradicional Festival de Brasília (Era Uma Vez Eu, Verônica, de Marcelo Gomes, e Eles Voltam, de Marcelo Lordello). Em 2013, Tatuagem, de Hilton Lacerda, ganhou o prêmio de Melhor Filme no pomposo Festival de Gramado. No mesmo ano, o aclamado filme de Kleber Mendonça Filho, O Som ao Redor, foi o indicado do Brasil para concorrer ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Em 2019, Bacurau, de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, conquistou o Prêmio do Júri no Festival de Cannes. A imprensa, por sua vez, legitimou este momento em sucessivas e enfáticas manchetes: “Pernambuco filmando para o mundo” (Revista Continente Multicultural); “Cinema de Pernambuco vive sua era de ouro” (Jornal Valor Econômico); “Cinema de Pernambuco revela uma novíssima geração de diretores” (Jornal O Globo). Toda essa repercussão do cinema contemporâneo de Pernambuco evoca uma série de questionamentos, que podem ser sintetizados assim: quais as razões dessa prolífica e conceituada produção cinematográfica? É uma vocação? É este o impulso que encontramos para seguir os rastros das memórias e resgatar uma história, arraigada de vontade, uma vontade que consome, um desejo incomensurável de fazer cinema, que tem seus primórdios lá no início dos anos 1920, quando, numa Utopia Provinciana, um grupo de jovens evoca a chegada do trem dos Lumière, no Gare de La Ciotat, numa das primeiras sequências do filme Retribuição, que inaugura o Ciclo do Recife. Não é preciso fazer grande esforço para demonstrar que o cinema feito em Pernambuco ocupa hoje um papel singular na cultura brasileira. Financiado principalmente por políticas de fomento público (estadual e nacional), esta produção conseguiu consolidar-se, mantendo uma impressionante continuidade desde o período da Retomada, com o Baile Perfumado em 1996. Reconhecido principalmente pelo frescor narrativo e ousadia estética, é considerado por críticos e cinéfilos como a produção mais autoral e pulsante do cinema nacional. São diversos profissionais, diretores, roteiristas, produtores, montadores aglutinados em grupos e coletivos de cinema, que transitam entre diferentes funções uns nos filmes dos outros. Como se faz cinema atualmente neste Estado? Quais são os grupos que produzem cinema aqui em Pernambuco? Como se configura o modo de produção, conhecido localmente como brodagem, ao longo das gerações? Como os sentimentos e afetividades de grupo vão aparecer nos filmes? O objetivo principal desta tese é discutir a história do cinema em Pernambuco a partir da constituição de grupos de cineastas que operam em um modo colaborativo de produção, conhecido localmente como brodagem. Os filmes realizados por estes grupos se configuram como uma atuação articulada em um mesmo momento histórico e inseridos em um mesmo cenário sociocultural e também por um programa de trabalho comum. A hipótese defendida pelo trabalho é a de que o suporte da produção e o da qualidade do cinema realizado em Pernambuco está vinculado a uma comunidade de afetos que permite a eclosão dos filmes. Por laços de amizade, afetos, valores e sentimentos compartilhados, os cineastas configuram grupos articulados em torno de uma estrutura social da brodagem. O intuito é entender em que medida as comunidades de afetos participam ou colaboram com a produção de cinema em Pernambuco. A proposta desta tese é, secundariamente, resgatar a trajetória dos grupos envolvidos na produção de cinema em Pernambuco: do Ciclo do Recife (década de 1920); a crítica e cineclubes dos anos 50, do Ciclo Super-8 (década de 1970), Vanretrô (década de 1980), a geração da década de 1990 (Kleber Mendonça e Camilo Cavalcante), a Símio Filmes, a Trincheira Filmes (início do século XXI) e os Coletivos de Audiovisual – a partir da reconstituição histórica de formação dos grupos e obras realizadas. E, na construção dos vínculos estabelecidos pelos cineastas, verificar até onde vai o afeto partilhado pelas diferentes gerações. Um afeto que tem a ver com os espaços da cidade do Recife, e por vezes acaba extrapolando, como faíscas que pulsam nas telas dos filmes. Link para tese: https://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/13147
- Resgate da memória gráfica do Festival de Inverno de Garanhuns
Designer dá movimento às identidades visuais do FIG como forma de preservar a memória do festival na pandemia Materializado pela primeira vez em 1991, o Festival de Inverno de Garanhuns (FIG) surgiu da necessidade e vontade de despolarizar os grandes eventos culturais do estado. Após dez anos sendo apenas uma ideia, em 1991 Marcílio Reinaux conseguiu, com parceria entre governo do estado e prefeitura, finalmente tirar do papel o projeto. Desde sua primeira edição, o FIG se propõe a dar conta da imensa variedade cultural pernambucana e brasileira. Para isso, abraçou todas as formas de linguagens artísticas; e foi se aprimorando com o passar dos anos. Três anos após a primeira edição, o festival soma aos seus pólos o circo. Em 2004, por exemplo, o cinema deixou de ser trabalhado apenas em oficinas e debates e tem sua primeira mostra de cinema integrada à programação. Na sua última edição (2019), o festival contou com mais de 500 atrações ocupando as ruas e os 21 polos espalhados pela cidade. E ainda apresentando novidades como: o Figuinho, uma programação especial voltada para o público infantil, e o Prêmio Palhaço Cascudo de Incentivo às Artes Circenses, que visa reconhecer, premiar e incentivar trajetórias de artistas circenses. Toda essa pluralidade sempre foi bem projetada nas identidades visuais do festival, e é através de intervenções em motion design que o designer e pesquisador Bruno Veríssimo desenvolveu a exposição online FIG in Motion (2020). A exposição é um dos frutos de sua pesquisa de conclusão de curso, que em 2018 foi transformada na exposição “Memória Gráfica do FIG”, que fez parte da programação da 28ª edição do Festival de Inverno de Garanhuns através de identificação, vetorização e preservação dos ícones visuais que marcaram a história do FIG. A exposição online FIG in Motion surgiu da inquietude de Bruno durante a pandemia para manter uma memória do FIG, que ano passado realizaria sua 30ª edição, mas foi cancelado devido a pandemia. Além da vontade do pesquisador em compartilhar de forma mais acessível sua pesquisa e a necessidade do resgate histórico e preservação da memória gráfica do festival. Natural de Garanhuns, Bruno Veríssimo acredita na potência do reconhecimento e pertencimento através das marcas desenvolvidas para o Festival de Inverno de Garanhuns. Bruno é também responsável pelo projeto O Design de Luís Jardim (https://www.luisjardim.com.br/), resultado de sua pesquisa para o mestrado no Programa de Pós-Graduação em Design da Universidade Federal de Pernambuco, em que cria um panorama das obras do artista Luís Jardim, com foco em seus primeiros trabalhos para a indústria gráfica pernambucana nas décadas de 1920 e 1930. Exposição FIG in Motion: https://www.instagram.com/figinmotion/ Exposição Memória Gráfica do FIG: https://www.behance.net/gallery/88799065/Exposicao-Memoria-Grafica-do-FIG
- Playlist: Caruaru é uma palavra que traz lembranças e desperta curiosidade
Lugar de encantos, poesias e memórias, Caruaru é uma terra amada. A Princesa do Agreste foi a musa inspiradora de canções inesquecíveis, e ainda hoje, continua inspirando novas gerações de músicos e ouvintes. De tão presente em músicas famosas, Caruaru é uma palavra que traz lembranças e desperta curiosidade. Curiosidades para quem vive longe da capital do forró, e principalmente, para quem está perto do que é retratado nas músicas: a feira, as ruas, o rio, o São João e o forró. São muitas histórias para cantar e sorrir. Em homenagem aos 164 anos da Capital do Agreste, a Spia reuniu em uma playlist músicas que falam da querida e centenária Caruaru. “Ai Caruaru, do meu tempo de menino” No dever de escolher uma canção para representar Caruaru, a minha escolha não poderia ser outra. “Caruaru do Passado'' de José Pereira, é uma música charmosa e indispensável em qualquer festa que tenha forró. Consagrada na voz de Azulão, a música nos leva para uma viagem no tempo, através dela conhecemos um pedaço glorioso do passado da cidade. Um passado de festas, comidas, banhos de açude, de um São João fervoroso e de ruas memoráveis. Azulão, também conhecido como o Pequeno Grande, é um legítimo representante da cultura caruaruense. A playlist tem música para tudo que é gosto. As músicas sobre Caruaru se caracterizam pela pluralidade de gêneros musicais. Tem forró, xote, baião, tem o pífano, o samba e muito mais. Uma pluralidade que tem a cara de Caruaru, uma cidade nostálgica que não deixa de olhar para o presente. Caruaru continua cheia de história para contar, e a Spia tem a honra de fazer parte dessa história. *Observação: foram colocadas na playlist apenas as músicas disponíveis no Spotify.
- Destaque abril 2021: A Noite do Espantalho
Trecho do filme Lançado em 1974 e dirigido por Sérgio Ricardo, o musical que acompanha Maria do Grotão, o jagunço Zé do Cão, o vaqueiro Zé Tulão e os desmandos do coronel Fragoso, tem motivos de sobra para ser o filme de destaque de abril. Apesar do diretor paulista Sérgio Ricardo, A Noite do Espantalho (1974) se tornou pernambucano. Seja pelo seu elenco com os pernambucanos Alceu Valença (Espantalho), Geraldo Azevedo (Severino) e José Pimentel (Zé do Cão), pelo local em que foi rodado (no teatro Nova Jerusalém, em Brejo da Madre de Deus) ou mesmo pela representação lúdica da fé e força de seus viventes. Para um tema já tão retratado, a luta de sertanejos contra os mandos feudais de um coronel, os roteiristas escolheram por incluir a psicodelia como elemento narrativo principal. Uma psicodelia nordestina com coco, embolada, repentes e instrumentos como a viola, a rabeca, flautas e muita percussão. Com a fé alegórica do Espantalho, mulher-dragão, motoqueiros-cangaceiros com fantasia de abelha. O filme ganhou vários prêmios, incluindo o prêmio especial dos festivais de Cannes e Nova Iorque. Foi o escolhido para representar o Brasil no Oscar de 1975, mas não conseguiu a indicação. Leia mais sobre o filme nessa resenha-crítica escrita por nossa colaboradora Samara Torres: https://www.spiarevista.com/post/o-agreste-psicod%C3%A9lico-em-a-noite-do-espantalho-1974